50 coisas a fazer antes de morrer

21/02/2021

Conhecida também como bucket list, e dignificada no filme "Antes de partir" (cujo título original é exatamente "The bucket list"), acredito que essa lista, quando feita com seriedade, reflexão e profundidade, é uma excelente oportunidade de autoconhecimento.

Muito antes de iniciar meu projeto de preparação para a morte, conheci a ideia num artigo na revista Seleções. Diferentemente do conceito original, que não estabelece quantidade, Wendy Swallow Williams sugere iniciar a empreitada numerando de 1 a 50 antes de escrever tudo o que se gostaria de aprender, fazer ou conquistar ao longo da vida.

Ela diz - e eu comprovei - que as primeiras saem com muita facilidade. São aqueles sonhos que acalentamos ou situações não resolvidas que nos incomodam. Aliás, é meio que mágico o efeito de escrever algo dolorido a resolver, porque depois de escrito é covardia apagar e a gente acaba se comprometendo. No filme, o personagem interpretado por Jack Nickolson não falava com a filha há anos e não sabia como aproximar-se para pedir-lhe perdão. No meu caso, uma pessoa querida havia me magoado profundamente e eu estava a ponto da matá-la dentro de mim. Dizer a ela o quanto havia me machucado apareceu imediatamente como o item 2 da primeira lista que fiz. 

Esse primeiro exercício me mostrou a força da ideia. Determinei-me a simplesmente escrever tudo que passava pela minha cabeça, sem censura e sem voltar atrás para ler o que escrevi - a leitura seria feita só após terminar para, então, efetivamente olhar para a Tania que se soltou. Os primeiros 15 ou 16 itens sairam facilmente. Eram conscientes. A partir daí fiquei "com a saca-rolhas" tentando extrair mais e mais desejos ou necessidades. Confesso que não cheguei aos 50, mas esse segundo bloco me mostrou no que eu me reprimia.

Terminada a extração de tudo em que pude pensar, a leitura me mostrou que não havia hierarquia nem homogeneidade. A ordem numérica não passava da sequência com que a ideia veio à cabeça, o que trouxe uma deliciosa sensação de liberdade. Conviviam com o mesmo status escrever um livro e dirigir um quad. No ano retrasado resolvi quase facilmente o desejo de dirigir um quad - não é fácil encontrar um para alugar e, ao esbarrar num, o item da lista "pulou" em minha cabeça (acho que a lista serve também para criar coragem de parecer ridícula nessas horas). Mas escrever um livro é um item que passou de uma lista para outra. Sim, porque depois de vários anos resolvi reiniciar o processo a partir do zero. Vários itens haviam sido completados, como ter um projeto de design de interiores publicado em revista (o que só foi possível quando me determinei a realizá-lo e, então, "descobri" que para isso acontecer eu teria de começar a enviar fotos para revistas...rsrs). Eu já tinha participado de um torneio de poker no exterior e não estava listado o desejo de viajar sozinha com meu neto, que só apareceu quando ele ficou mais velho. 

Ponderei que uma nova lista me daria nova oportunidade de aprender mais sobre mim mesma - e foi o que realmente aconteceu. Minha segunda lista ficou ainda menor, mas o primeiro item continuava lá, como primeiro da lista. Estava escrito assim: viver por 90 dias na Nova Zelândia. Acho que quando o escrevi pela primeira vez, era um sonho. Eu falava sobre isso, mas não visualizava a possibilidade de 90 dias. Quando o escrevi novamente e não reduzi o número de dias, entendi que era mais do que um sonho - era um movimento meu de busca do desconhecido, de vontade de aprender pela vivência e com o corpo inteiro. Se tornava um caminhar em direção a usar uma tinta nova para colorir minha vida que já era colorida; mas que clamava por um choque de beleza natural e um mergulho na cultura da qual eu queria me apropriar.

Esse, como alguns outros itens, só poderia ser realizado se houvesse muito planejamento e até mudanças significativas na vida. Essa análise foi muito interessante porque, para fazê-la, tive que me perguntar: escrevi por escrever, ou é mesmo algo que realmente quero "fazer antes de morrer"? É uma pergunta solene, porque desencadeia um sentido de urgência, nascido do fato de que não sei quando vou morrer e não quero ser pega desprevenida. Foi nesse processo de questionamento que percebi que aquela aventura estaria condenada a ser um mero desejo se eu não a levasse realmente muito a sério. 

Agora que faltam só 4 itens para esgotar minha lista atual, concluo que o objetivo não é colocar um sinal de check em todos eles para dar por concluido o "projeto", porque enquanto houver vida há movimento, há renovação. Sei que já não posso mais me dar ao luxo de deixar de ter uma lista com o máximo de coisas interessantes a fazer em que puder pensar. Estou trabalhando para realizar essas que conheço, mas já estou pensando em escrever outra lista. Quero uma atualizada, diversificada e bem maior para tirá-la da pasta de vez em quando, ler em momentos calmos com o respeito que ela merece, pinçar um novo item mesmo que seja insignificante (se for o caso, tratá-lo como importante que é) e questionar como realizá-lo, enfim, desafiar o vício da vida que cai no cotidiano. Tudo está bem, tudo está ótimo, mas sei que essas pinceladas de cores novas são, em parte, responsáveis por não deixar minha paisagem se desbotar; até porque não aceito morrer em sépia. 


Autor do artigo
Tania Paris